Si
molesto com mi canto
A
alguno que venga a oir
Le
aseguro que es un gringo
O
un dueño deste pais
Daniel
Viglietti – A
desalambrar
Bem diz a cautela
histórica que não somos capazes de alcançar a envergadura das
ações no momento em que transcorrem. Mas a quantidade de gente
querendo se assenhorar dos últimos acontecimentos, de tão pródiga,
nos obriga a lançar luzes sobre sombras para buscar, pelo menos,
decifrar o que é real e o que segue sendo fantasmagórico no atual
quadro.
É a política,
idiota!
Sempre
subestimei a iniciativa que contesta o tema passagens de ônibus. É
evidentemente, um tema periférico. Custa a crer que o tema
efetivamente empolgue estudantes. Mas eis que essa garotada do
Movimento Passe Livre conseguiu fazer o que sindicalistas e
militantes profissionais não conseguiram. Projetar a indignação de
uma causa menor para os temas reais e candentes da sociedade.
De
fato, transporte pago é uma ofensa ao direito de ir e vir. É,
inclusive parte do custo do produto “mão de obra”. No entanto
não existe real solidariedade da sociedade em relação a essa
questão. Mas eis que um intervenção tão pretensiosa quanto todas
as outras e não mais que isso, em dado momento, ganha corpo
transcendente.
A
mídia quer esquecer completamente o debate, mas parte daquelas
pessoas que olharam com esperança as manifestações já tem como
certo que o questionamento aos custos do transporte público é
tarefa elementar da cidadania. Os que possuem condições não
padecem dessa limitação de locomoção. Mas o trabalhador sem
dinheiro estará obrigado a pedir emprestado até mesmo par achegar
ao trabalho e continuar a receber seu salário mês a mês.
A
locomoção na cidade não pode ficar refém daqueles que a operam
com finalidade de lucro.
Em
tempo, não me escapou um singelo cartaz afixado fugidiamente na
avenida paulista com os dizeres “volta CMTC”.
It's the Everything,
Stupid!
Não
tardou nada até que o levante contagiasse parcela expressiva da
população, especialmente estudantes e a eles se unissem inúmeros
descontentes, a exemplo dos Indignados espanhóis (se não nos deixam
sonhar, não os deixaremos dormir), ou dos Piqueteiros argentinos
(“que se vão todos”)
A
primeira perplexidade social surge exatamente em relação ao mote
das manifestações. Concretamente o aumento de R$ 0,20 nas passagens
de ônibus da cidade de São Paulo, surgiu como catalisador. Mas
somaram-se aos manifestantes de primeira hora um conjunto de
manifestantes para quem os R$ 0,20 era o menor dos problemas, se é
que eram problema.
Mas
se o processo epidêmico é bem-vindo nas causas políticas, não
havia porque nos surpreendermos com a incorporação das
transversalidades todas. Um movimento horizontal, plural e
descentralizado não tardou 48 horas pra atrair descontentes de todos
os matizes.
Inclusive
os descontentes com os descontentes.
Eis a
mais flagrante fragilidade de uma insurgência com essas
características. Evidentemente não ficariam de fora os reacionários
que ao longo de anos tentaram lotar as ruas, nunca indo muito além
de uma centena.
Movimentos
“pela paz” ou “anticorrupção” são expressivamente
conservadores os primeiros porque ignoram o clamor dos excluídos
para quem, “paz sem voz é medo”, os segundos porque só
enquadram a corrupção passiva, quando não são acalentados
justamente pelos corruptores para eximirem-se de suspeitas.
A
esses todos, assim como aos confusos que apenas se contentavam em
assistir de camarote, logo ocorreu a polêmica. “Tudo isso por
apenas R$0,20?”. “Não é apenas por R$0,20, estúpido”.
“R$0,20 é apenas o começo!”. “R$0,20 é o fim do mundo!”
“R$0,20, ora os R$0,20!” “Nada é tão tudo quanto R$0,20”.
Não
tardou, é claro para que surgissem bandeiras socialmente mais
criativas: “Crack por R$0,20 o papelote”. “Saldão: Ocupai as
lojas que cobram mais do que R$0,20!”
“¡Que se vayan
todos!”
Partidos
e vanguardas de esquerda por vezes se consideram com mandato divino
para a indignação. Sobretudo aqueles que atiram em todas as
direções, em algum momento haverão de ter incluído as passagens
de ônibus urbano entre suas bandeiras históricas.
Afirma
a filosofia futebolística que “quem não faz, leva”. Fato é que
essas vanguardas nos esquecemos de notar que quanto mais tempo
deixamos de viabilizar a ruptura da ordem, mas nos aproximamos, aos
olhos dos cada vez mais excluídos, ou incluídos na pauperização
da inclusão, entre os defensores do status quo. Com efeito, se
tardamos demais com a revolução, a rebelião social, quando ocorre,
é também contra nós.
O
anonimato é mais nocivo às causas populares do que a
auto-proclamação. Mas o azar é dos que deixaram de perceber que o
modelo de partidarismo vigente é o burguês conservador. Por mais
que sejamos controversos em relação a ele, nos subordinamos aos
seus ditames. A banalização da política, mais que isso, sua
“fulanização” é promissora aos oportunistas. Quando nos
negamos a denunciar o formalismo instrumental da política, a
detenção de poder nas mãos de poucos, enfim, as proclamações de
elites detentoras de verdades, estamos, nesse quesito específico,
nos alinhando ao status quo.
Não
por acaso, Lutero realiza uma importante reforma no mundo cristão
ocidental, quando anuncia a destituição de prerrogativas especiais
na guarda do conhecimento e acesso à divindade por parte da
escolástica, dos iluminados, ou dos delegados institucionais.
A fé,
bem como a democracia, a riqueza que a humanidade produz, o espaço
urbano etc pertencem a todos. Os que secundarizam essa simples
constatação encontram-se alinhados, à vista dos não alinhados,
como partes ou fragmentos de um todo unitário.
As
faces do terror, ou a sua sombra?
É
assustador. O crepitar das chamas no contexto social sempre parece
agredir nossa benevolência com o ordenamento autoritário. Mas o
fogo é rebelde por excelência. Existe enquanto não consome tudo o
que lhe permite a sobrevida. Não é seletivo, cordato, ou submisso.
O que
escapa à visão dos escandalizados é que fogo contra fogo apenas
aprofunda o incêndio.
O
fogo da rebeldia sempre será sagrado quando confrontado com o fogo
premeditado da ordem. Tudo o que foi destruído em todas as
manifestações por parte dos rebelados não se equipara a um único
hematoma provindo da arma de um torturador do Estado. Não vale,
aliás, uma só lágrima produzida por efeito do gás lacrimogênio.
Mas
os hipócritas são muitos, inclusive os que sorriram e jactaram-se
diante da emboscada urdida pelo aparato repressor paulista.
Vou
lançar aqui a minha gotinha de denúncia do descalabro. Quem
circulou pelas imediações da Av. Paulista no dia 12/06 pode
conferir a TOCAIA DA TROPA DE CHOQUE preparando o bote aos
manifestantes. Os estúpidos leem as mentiras de jornal e nem sequer
raciocínio. Naquele dia, por exemplo, não haveria que se falar em
transtorno ao trânsito na Paulista. Simplesmente porque POLÍCIA E
CET ELIMINARAM TODO O TRÂNSITO. Ninguém conseguia acesso, no máximo
cruzar a avenida.
Essa
apenas a mais prosaica das mentiras.
OS
MANIFESTANTES FORAM, SIM, EMBOSCADOS NA CONSOLAÇÃO. Imagino os
idiotas de farda tendo orgasmos ao dizer coisas como “vamos da um
pito nos meninos”. Um comentarista que até respeito postou no
facebook que os manifestantes DEVEM ajudar na identificação dos
vândalos e baderneiros. ALTO LÁ! NÃO DEVEM NADA!!!!!! É o estado
que deve a nós todos.
Não
sei desde quando a PM filma manifestações. Acho que desde sempre.
Razão pela qual é um acinte ouvir que nós, o povo, é que devemos
tomar precauções. ATÉ PODEMOS, mas o que eu duvido mesmo é que a
polícia não tenha condições de identificar. Não há mesmo é interesse. E por que será?
Há uma resposta singela no vídeo
abaixo:
Deu
pra entender? Deu pra entender, ou é preciso desenhar?
Não
há palavras para mencionar o cinismo das explicações oficiais. Não
vou repetir, mas cada sílaba publicada em favor da razão coercitiva
da política é tão criminosa quanto as ações da mesma. Alguns
amigos e amigas confiam na neutralidade cívica da polícia. Fiquem à
vontade, mas me incluam absolutamente fora dessa.
Aliás,
antes que me esqueça, já que a mídia toda esqueceu. DIRETA OU
INDIRETAMENTE AS RESPONSABILIDADES NOS CASOS EM SÃO PAULO SÃO DO
GOVERNADOR GERALDO ALCKMIN. Seja pelo mando, seja pela negligência,
ele é a autoridade coatora responsável por cada projétil de
borracha, cada lágrima causada pelo gás pimenta.
A
coisa do vinagre, então, é um momento das ficções de realismo
fantástico que são despejadas na realidade. Pessoas presas por
portarem vinagre.
As
pessoas “da paz” podem dizer o que quiserem. Tanto quanto, na
dúvida pró-réu, na dúvida, A CULPA É DO ESTADO. A culpa é da PM.
Divulguei
ainda a pouco um depoimento que traz o seguinte: "Aproximou-se
de mim um sujeito com o rosto tampado por uma camiseta. Ele descobriu
parcialmente a face e me disse no ouvido que era policial e que
pediria que não atirassem para que pudéssemos evacuar a vítima
(penso ter visto esse autodeclarado policial perto de mim, quando eu
tentava falar com um oficial, e depois correndo ao meu lado. Se for a
mesma pessoa, ele era um dos exaltados que instavam à violência)."
Isso ocorreu em Belo Horizonte.
Se os
governantes fossem minimamente decentes entregariam seus cargos. Como
não são, ao menos por competência deveria destituir todas as
autoridades militares de seus postos e renovar a totalidade dos
comandos. Mas certo mesmo seria acabar com essa gang de criminosos
oficiais desmilitarizando a polícia.
Bem,
eu iria seguir com os comentários, mas reviver algumas manifestações
oficiais não me permitiriam mais que dizer impropérios. Vou poupar
os bytes e a paciência geral.
Se os humores me permitirem avanço na narrativa.