E se o PT tivesse cumprido a vocação
história de sua criação? A pergunta pode parecer singela, capciosa
ou equivocada. Só que no meu caso ela apenas revisa uma análise
feita no início do governo Lula. Nos idos de 2003 já com a Reforma
da Previdência de FHC em curso pelas mãos de Lula (via Ricardo
Berzoini), como primeira medida oficial de seu governo, perguntei
porque Lula, ao invés de cruzar a esplanada com os governadores não
estava cruzando com o povo?
Outro companheiro pleiteava um “choque republicano”, eu, baseado nos mesmos questionamentos, preferia um “choque de democracia”.
Os acólitos apontarão para o
Chavismo. Mas como comparar as obrigações do coronel paraquedista
venezuelano com a do maior ícone político da esquerda no Brasil. O
populismo não era a única possibilidade para Lula, porque todos
temem a democracia, mesmo os que a defendem como valor universal?
Creio que todos estamos vibrando com as
manifestações que percorrem o país, mesmo considerando suas
contradições. Porém, como não perguntar se era preciso chegar a
isso para que as centrais sindicais “se tocassem” da necessidade
de retomar uma pauta classista comum?
Estive na primeira posse de Lula, um
momento histórico para a maioria de nós. Naquela oportunidade
companheiros que ainda acreditavam me entregaram um belo calhamaço
chamado Programa de Segurança Alimentar, era o vulgo Fome Zero, cuja
frustração afastou do governo todo um “staff” comprometido não
apenas com um programa assistencial, mas um modelo de organização
popular que já era maior, enquanto proposta política, do que os
círculos bolivarianos. E o bolsa família era apenas a cereja do
bolo.
A dúvida que ainda me ocorre é,
porque Lula, com a estatura que possuía (o tempo foi lhe vergando
inapelavelmente) abriu mão de seu maior patrimônio? Poderia ter
superado o legado Vargas, ao invés de tentar revertê-lo.
Lembro que eu já chamei Lula de
estadista e fui dura e severamente advertido por um companheiro.
Nunca mais cometi esse equívoco. De fato, uma das características
mais emblemáticas dele e seu governo foi o anti-estatismo, elegeu
como um dos principais adversários os servidores públicos federais
e, lamentavelmente estava muito mais habilitado do que seu antecessor
para dinamitar as conquistas desse segmento, um dos poucos no mundo
que deu combate diuturno ao neoliberalismo a ter vitórias pontuais e
parciais importantes.
Enfim, tenho que agregar um novo
questionamento ao rol de leviandades do lulismo. Teria sido
necessária uma articulação autônoma da sociedade, para que o
lulo-petismo tivesse um soluço democrático?
Articulação essa, aliás, que prefere
alijar não apenas a esquerda, mas toda a esfera política do país
para fazer com que um governo ambicionado pelas mobilizações
sociais que foram fundamentais para botar abaixo a truculência
civil-militar de 1964, lembrasse que o protagonismo das ruas não é
um capricho democrático, mas o indutor efetivo de mudanças?
Uns acham que éramos nós, os
movimentos obrigados a forçar o governo para a esquerda. Na minha
reles ignorância política, sempre achei que um governo que precisa
ser convencido a ser democrático, não pode ser considerado herdeiro
da nossa história.
Sei lá, Lula, eu aceito o argumento do
bolsa família, mas não subverta a democracia tanto assim. Veja se o país precisava chegar a essas cenas apenas pra que alguém lembrasse o que significa democracia?